MANGÁS – A NONA ARTE NO JAPÃO

A REPRESENTAÇÃO EM IMAGENS DE UMA NAÇÃO

No ano de 2016 um “discreto” Museu francês localizado no coração de Paris, realizou uma exposição para celebrar a “nona arte”, que incluiu na curadoria, obras de mangás de Naoki Urusawa exímio e premiado Mangaká, nome pelo qual são chamados os desenhistas e criadores de mangás no Japão. 
Não é de hoje que tais obras são apreciadas culturalmente, já em 64, o crítico francês Claude Beylie é o primeiro a introduzir o conceito de arte no universo das histórias em quadrinhos, exagerado? Não é o que pensam os fãs, e o Museu do Louvre. Esse processo de reconhecimento ganhou força desde a afirmação do crítico francês e embora esse mercado tenha passado por um crise nos últimos anos, as histórias em quadrinhos há muito estão em destaque. No Japão em especial, são parte integrante da sociedade, lá, todos leem os famosos Mangás. 
Para compreender a extensão e influência dos mangás no Japão e mundo afora, precisamos retomar um pouco do contexto histórico e social ao qual emergiu essa arte. 
Mangá Mujirushi de Urasawa, desenhado especialmente para exposição no Louvre

CONTEXTO HISTÓRICO 

Após os consequentes impactos econômicos, sociais e morais, reflexos da participação dos japoneses na segunda guerra mundial, ocorreu a necessidade da nação de reerguer o seu povo em prol de uma sociedade mais humanista, em um apelo ao bem comum . Nesse contexto, surgem as primeiras publicações de mangás em busca do resgate de valores e esperanças. Em princípio as narrativas eram voltadas ao público infantil e enfatizavam temas como: sonhos, amizade, cooperação, liberdade, através de alegres aventuras. Esse tom “Disney” não é apenas uma coincidência. O grande Osamu Tezuka, conhecido como o “Deus” dos mangás, por sua contribuição revolucionária no gênero, destaca ter inspirado seu estilo de desenho e narrativas nas animações de Walt Disney. Sua técnica apresentava novas características, como os marcantes olhos grandes e arredondados, o uso de onomatopeias e narrativas sequenciais cinematográficas, que contribuíram para retomada no ânimo e espírito da nação japonesa. 

 “Por que os filmes americanos são tão diferentes dos japoneses? Como eu posso desenhar quadrinhos que façam as pessoas rir, chorar e se emocionar como aquele filme? ’’. 

 Tezuka O.

A esquerda Naoki Urasawa e a direita Ozamu Tesuka


Somente mais tarde no final da década de 1950, surgem narrativas de teor adulto, com temáticas políticas e críticas sociais. Essa nova leva de artistas passaram a produzir mangás mais desafiadores e dramáticos que refletiam as desilusões do período pós-guerra e o conflito étnico nacionalista. Atualmente os mangás possuem um mercado consolidado na terra do sol nascente, lá as publicações são semanais, divididas por capítulos e publicadas por revistas específicas, que trazem ao leitor diversas histórias. Somente após certo sucesso e interesse são compilados em volumes encadernados, tais como estamos acostumados no Brasil. 
O público alvo é extremamente variado, são produzidos mangás em diversas categorias, desde o infantil ao adulto, temas que se estendem a ficção, aventura, dramas, esportes, ação, colegial, LGBT, eróticos, terror. Sempre com traços característicos japoneses que enfatizam o relacionamento afetivo do consumidor em uma identificação direta com o produto. 
A esquerda a Obra a Princesa e o Cavaleiro e a Direita a obra Lobo Solitário. 

DIFERENÇAS E CARACTERÍSTICAS

A forma e a estética dos quadrinhos japoneses, envolvem uma expressão única, que dá margens a uma dinâmica fantasiosa e exploratória. Esse espírito, tão enraizado, é representado pelo significado da própria palavra, união de dois ideogramas japoneses. 

 “Man” 漫 tem um significado primário de “involuntário” e secundariamente “moralmente corrupto”. Já o ideograma “Ga” 画 significa imagens. 

Os mangás atuam no campo visual de representações, podem ser compreendidos em sua essência como “imagens involuntárias”, rascunhos livres e inconscientes, que expressam situações excêntricas da sociedade. A característica iconográfica desse estilo, difere do modelo americano, nesses o layout enfatiza a importância dos quadros individuais, prendendo a atenção do leitor aos detalhes e o diálogo envolvido. Os quadrinhos japoneses pelo contrário, tem característica fluida, devido a ausência de diálogos extensos e elaborações textuais. 
A dinâmica de leitura e diagramação priorizam menos quadros por páginas, o layout incentiva o leitor a mudar as páginas rapidamente, entrando no ritmo da narrativa, o leitor “devora” a história, repleta de elementos em movimento e expressões faciais. Há maior variedade de códigos visuais que destacam o estado emocional dos personagens, deixando o elemento textual em segundo plano. Ler mangás é dialogar com imagens. Um exemplo é o uso de onomatopeias para transmitir sons, emoções, e situações, sem a necessidade de explicações sobre, onde a imagem fala por si. Destarte apesar de pouco ênfase dialogal, as histórias mantém a riqueza em seu elemento narrativo pela continuidade cronológica da obra. 
A esquerda uma HQ americana da Viúva Negra, A direita a obra em mangá Akira.

Os enredos possuem início, meio e fim, bem definidos, com elementos narrativos típicos de produções cinematográficas, que contém a apresentação, desenvolvimento e conclusão da obra. Algumas publicações são tão extensas que levam anos para serem terminadas, como no caso de One Piece e Naruto, que atravessam gerações. O leitor nesse caso pode então acompanhar a evolução dos personagens ao longo dos anos, o público cresce junto a obra, que se torna presente no cotidiano. 

ARTE E CULTURA 

Em resumo três os pilares de um Mangás: imagens sequenciais, caixas de fala, e onomatopeias. Suas características principais: ênfase em expressões, diálogos menos extensos e representações socioculturais. 
   A Esquerda o mangá Eyeshield 21, a Direita o icônico mangá de Dragon Ball.

Os Mangás carregam em si os paradigmas e símbolos da nação japonesa, que permite a maior identificação do leitor com a obra. Esses quadrinhos embora sejam objeto de lazer, tem importante papel social, através do qual são transmitidas informações valiosas sobre história, cultura, mitologia, crenças e ensinamentos do Japão. Essa arte é embaixadora dos costumes japoneses, por suas enigmáticas características e enredos bem elaborados,que conquistaram reconhecimento e o coração de fãs no mundo, consumidoras fiéis, que tem como meio de contato direto com o oriente essa forma de expressão artística chamada Mangá. 

 REFERÊNCIAS  

GRAVETT, PAUL. Mangá: Sixty Years of Japanese Comics. Collins Design.2010.

LEDO LFP. MANGÁ: As histórias em quadrinhos que servem como fonte de informação acerca da mitologia japonesa. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. 2018.

WINTERSTEIN CP. Mangás e Animes: sociabilidade entre cosplayers e otakus. UFSCAR.2010

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